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Felipe Soares

Coluna / Filosofia / Viva nosso tempo!

As redes sociais nos dão a possibilidade de ler as mais diversas opiniões sobre os mais diversos temas. A possibilidade de postar um texto, um argumento ou uma observação, ou de apenas dar uma “curtida” no post de alguém, abre espaço para que as pessoas exponham de forma mais recorrente suas inclinações, seus interesses e suas opiniões acerca dos temas que surgem nos contextos virtuais.


Foto: anavictorazzi.files.wordpress.comFoto: anavictorazzi.files.wordpress.com

Por isso, essas redes sociais constituem, sem dúvida, um vasto material sociológico, antropológico e histórico. Refletem, de alguma forma, ou de várias formas, o contexto e a disposição das pessoas que as utilizam, funcionando como um espelho dessa parcela da sociedade que se vale das páginas virtuais como locais de informação, discussão e expressão.

Tenho visto de modo bastante recorrente um determinado tipo de discurso e de postura, que se constitui de argumentos e propostas pretensamente bastante coerentes, vindos de cidadãos respeitáveis e comprometidos com o avanço político, moral, social e científico do mundo, que se expressam da seguinte forma, segundo os exemplos:

Testes em animais?
É pelo avanço da ciência e pelo bem da humanidade. Se você não gosta, vai lá e deixa testar em você!!

Mataram o bandido?
Tem que matar mesmo, porque bandido bom é bandido morto. Se tem dó, pega e leva pra sua casa!!

Bolsa-família?
O governo populista dando dinheiro pra gente preguiçosa e acomodada. Tem que ensinar a pescar, e não dar o peixe!!

Menina fez boquete?
Ela é uma depravada sem educação e sem moral. Ainda se faz de vítima se é estuprada na rua depois!!

E por aí vai...
Esta me parece ser a racionalidade e a disposição afetiva da opinião pública mediana hoje em dia - ou pelo menos da opinião pública mediana dos cidadãos que utilizam a internet como local de expressão e discussão.

Há algumas características comuns que ressaltam desse discurso e da postura a ele atrelada, a saber:

1) As respostas são diretas, imediatas e superficiais, por isso com aparência de obviedade.
2) Quem as propaga o faz com aparência de consciência tranquila, de ser bem resolvido(a), bem instruído(a), pragmático(a) e de não ter dúvidas quanto à direção a seguir.
3) Essas pessoas estão em constante auto-referência (antropocentrismo quando se trata de espécies; egoísmo quando se trata de indivíduos; conservadorismo quando se trata de classe social; moralismo quando se trata de tabus).
4) Elas revelam a postura de indiferença e de segregação e a inferiorização do outro e do diferente (o pobre, o bandido, o animal, a puta).
5) Elas acabam na proposição ou na aceitação de violência, num espírito de vingança ou de sujeição ("tem que matar mesmo"; "foi estuprada mas fez por onde"; "o bicho sofre mas é por um bem maior"; "tem que pôr esse povo pra ralar e se esforçar mesmo").

Pergunto: como questionar verdadeira e intimamente esse discurso/postura, já que seus proponentes:

- têm respostas fáceis e sentem-se confortáveis com elas;
- têm suas próprias vidas como a referência de validade de tudo;
- inferiorizam e hostilizam o diferente deles mesmos;
- estão dispostos a justificar, até mesmo com agressividade e violência, a sua condição e a do rebaixado;
- e ainda veem uma grande maioria de vozes lhes fazendo coro em consonância?

Viva nosso tempo!




Felipe Soares
 possui formação em Filosofia, tendo obtido a Licenciatura e o Bacharelado, com formação complementar em Letras e Ciências Humanas, em 2005 e o Mestrado, na linha de Lógica e Filosofia da Ciência, em 2008, pela UFMG. Estuda, escreve e desenvolve trabalhos como professor e músico.

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